domingo, 6 de setembro de 2009

Reconhecimento

Resolvi começar esse diário hoje por ser uma das maneiras com as quais eu posso conversar comigo mesmo. Sim, pois não acho que algumas pessoas, pra não falar a maioria, entenderiam o que me motiva a começá-lo.
Hoje, eu dirigi pela primeira vez após eu ter conseguido a habilitação. Carro do meu irmão Gabriel*: um Citroën C3, motor 1.6, direção elétrica, e tudo mais. Só pra comparar: para fazer as aulas na auto-escola, eu usei um Fiat Palio 1.0, direção mecânica, e nada mais.
Eu estava indo ao supermercado com meus pais. No caminho até lá, tem um morro que acho que era mais fácil falar em escalar o morro do que subir. Precisei reduzir a marcha para ganhar torque. Claro que isso tinha que dar errado. Os giros do carro foram a assustadores 6000 rpm. E nada de o carro ganhar “força”. Tudo porque eu errei uma pisada de pedal.
Na volta, deixei o carro desligar quatro vezes. Seguidas. No semáforo. Num cruzamento com uma avenida. Eu já estava mentalmente rogando pragas àquela embreagem baixa.
– Você tem que deixar de ser menos estressado, não só no trânsito – disse minha mãe.
Todo mundo, grupo no qual eu me incluo, ODEIA com todas as forças que alguém fique falando enquanto se dirige. Agora junte o fato de ser estréia da minha CNH. Ingrata a hora em que eu falei pro meu pai que eu dirigiria.
– Mãe, deixa eu dirigir do meu jeito, por favor – eu disse, tentando soar gentil.
Chegando em casa, deixando o carro desligar mais uma vez, claro, minha vontade era de rasgar a minha CNH em mil pedaços e atear fogo nas últimas migalhas que sobrassem dela.
Nunca me fez falta ter um carro, já que “tenho cinco motoristas a minha disposição”, como já diria o sarcasmo sempre à ponta da língua de Paulo*, meu irmão mais velho. Outro motivo é esse: não que eu seja um ecochato, mas eu sempre vou à universidade de ônibus, a pé ao supermercado, etc. Não faz sentido eu ter um carro. Não é uma necessidade, e sim um gasto que, agora, não vale a comodidade.
Agora junte essa péssima experiência.
Eu não quero dirigir mais.
'Tá, e o que tem a ver o fato de eu ser um péssimo motorista habilitado com o que me motiva a escrever?
Depois de não ter satisfeito meu desejo piromaníaco para com a minha CNH (para a felicidade do leitor), eu desatei a chorar isolado no quarto pela minha imprestabilidade, questionando minhas qualidades segundo pessoas ao meu redor dizem: inteligência? Ah, informação está à disposição a todos, resta que elas se disponham a obtê-la. Gentileza? Não mais do que minha obrigação. Prestatividade? Tudo o que eu tenho sentido são as solas dos sapatos dos folgados.
Isso explica a minha situação de “bevidade” (não esqueci o “r”) aos 20 anos: sou bonzinho demais.
Tudo se encaixa tão perfeitamente para os outros, mas por que não para mim? Não sei dirigir, mesmo sendo habilitado. Não sei me relacionar com segundas intenções com pessoa alguma. Não enxergo reconhecimento pelo que eu faço nem para mim, nem para os outros. Compensa ser assim?
Compensa viver assim?
Mente de pessoa deprimida é complicada. Pessoas normais com certeza diriam “isso é uma bichONA".
Deprimida? Sim, levou-me tanto tempo para reconhecer a minha doença. Nunca ficou tão claro quanto agora.
Antes, eu julgava ser muita fraqueza de espírito gastar dinheiro com psicoterapia, pois eu tinha um preconceito muito grande contra a profissão do psicanalista: uma pessoa que se julga acima do céu e da terra e que fica lá, resolvendo sudôku na prancheta e cronometrando o tempo da sua sessão, porque a sala de espera está “cheia de gente louca”, enquanto você se lamuria, rebaixado à posição do divã.
Eu sempre tentava, sem sucesso, lutar contra esse problema. Resolvia vez ou outra, mas alguns dias depois, lá estava eu, de novo, down.
O que eu tenho a perder, não é mesmo?

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